De tudo
Império do Caos em total pandemônio
22/10/2015, Pepe Escobar, Sputnik News
Traduzido por Vila Vudu
A zona aérea de exclusão já existe na Síria. É controlada pela Rússia e Washington não tem como invadi-la ou interferir nela.
A OTAN está desesperada. O Pentágono está desesperado. Imaginem acordar um dia em Washington e Bruxelas, só para descobrir que a Rússia tem a capacidade técnica necessária para invadir e desarticular – detectar, rastrear, desabilitar, destruir – todo o equipamento eletrônico da OTAN numa área de 600 km sobre a Síria (e o sul da Turquia).
Imaginem o pesadelo de ter o radar russo Richag-AV invadindo e desarticulando camada após camada e o sonar invadindo e desarticulando todos os sistemas montados em helicópteros e navios, desarticulando tudo que haja por ali, rastreando e localizando toda e qualquer fonte existente de radiação eletromagnética. Não só na Síria, mas também na Ucrânia.
O tenente-general Ben Hodges, comandante das unidades do Exército dos EUA na Europa, foi forçado, mesmo, a descrever as capacidades russas para guerra eletrônica na Ucrânia como “descomunais” [orig. eye-watering].”
Por sua vez, colhida no fogo cruzados como patas chocas ou galinhas sem cabeça, aquele gigantesco porta-aviões ideológico conhecido como USS Think-Tank-e-lândia foi deixado lá, para fazer o que conseguisse das quatro vias que sobraram para que Washington “alcance suas metas” na Síria.
A primeira via é a contenção – exatamente tudo que o governo Obama fez até hoje. A receita foi proposta de cima abaixo pela Brookings Institution: “conter as atividades deles dentro de estados falhados ou quase falhados é a melhor opção para o futuro previsível.”
Mas isso, argumenta a Think-Tank-e-lândia, “esmagaria a oposição popular” na Síria. Problema, aí, é que não existe “oposição popular” na Síria; só existe o governo em Damasco ou o poder dos bandidos salafistas de ISIS/ISIL/Daesh.
A segunda via é a favorita dos neoconservadores e neoliberais conservadores dos EUA: armar a já muito armada ‘oposição’. Essa ‘oposição’ vai dos curdos do YPG – que realmente combatem em solo contra ISIS/ISIL/Daesh – à Frente al-Nusra, codinome al-Qaeda na Síria e seus parceiros salafistas. Claro que a Frente Al-Nusra, codinome al-Qaeda na Síria, foi rebatizada na av. Beltway em Washington de “rebeldes moderados”. Assim sendo, essa via significa na prática que a Casa de Saud armará a al-Qaeda que lutar sob a proteção aérea dos jatos norte-americanos.
É puro teatro do absurdo à maneira de Ionesco. E acrescente-se o fato de que aqueles pirados apocalípticos que passam por “clérigos” na Arábia Saudita, além da Fraternidade Muçulmana, já declararam Jihad contra a Rússia.
Combatentes islâmicos militantes acenam bandeiras em um desfile militar ao longo das ruas da província de Raqqa, norte da Síria. © Stringer / Reuters
A terceira via possível não vai a lugar algum: Washington alia-se com “Assad tem de sair” e o Irã – para nem falar de Rússia – em combate à vera para acabar com o ISIS/ISIL/Daesh. Obama se autoencurralou há muito tempo, com a conversa de “Assad tem de sair”, o que significa que permanece imobilizado até hoje num ippon autoinfligido.
A quarta via é o sonho molhado dos neoconservadores: mudança de regime completada, em teoria, pelo que tenho chamado de Coalizão dos Oportunistas Finórios (COF), como no caso dos sempre abraçados CCG-OTAN, com a Turquia no papel de principal vedete e ataques aéreos norte-americanos atachados, mais todos aquele milhares de “moderados rebeldes” treinados pela CIA que capengariam até Damasco. Como se a campanha russa nem existisse.
De fato, para a mídia-empresa norte-americana, é como se o perfeito e consistente massacre – não alguma ‘contenção’ – que os russos estão aplicando nos quadros do “Califato” durante as três últimas semanas não estivesse acontecendo. Começou como húbris, virou terrível embaraço e agora há é omissão total.
O diktat do governo Obama de “Assad tem de sair” também se metamorfoseou numa versão alucinada de negação sem negativa. É absolutamente óbvio hoje que a campanha aérea russa, muito mais que ISIS/ISIL/Daesh, destruiu todo o jogo imperial por todo o “Siriaque”: a mesma velha mistura de mudança de regime, balcanização, criar e conservar estados falhados, “isolar” a Rússia.
Sobretudo, e ao contrário da atual reencenação da mitologia afegã – onde, por falar nisso, os Talibã continuam a vencer a Mais Longa Guerra Norte-americana – a Síria não será algum novo sorvedouro, como foi sorvedouro de soviéticos. Ao contrário: enquanto no Afeganistão nos anos 1980s funcionou a jogada imperial de usar jihadistas salafistas contra governo secular, como também funcionou quando a OTAN converteu a Líbia em estado falhado, hoje Moscou está fazendo a engenharia reversa daquele processo: está esmagando salafistas-jihadistas em solo, associada a governos seculares.
Ou é (bombardeio) do nosso jeito, ou caiam fora
Com o que chegamos ao Iraque.
Semana que vem, o Parlamento do Iraque decidirá se solicita ajuda dos jatos russos na sua luta contra ISIS/ISIL/Daesh. Mowaffak al-Rubaie, ex- conselheiro de segurança nacional do ex-primeiro-ministro Nouri al-Maliki, está convencido de que a solicitação será aprovada – apesar de enfrentar a oposição sunita e de parte dos curdos iraquianos.
Para avaliar o pânico que consome Washington, basta lembrar que o novo comandante do Estado-maior do EUA, general de Marinha Joseph Dunford foi obrigado a voar até Bagdá, para garantir que nada disso aconteça. Nas palavras de Dunford, o Pentágono consumiu-se em “angústia” quando o primeiro-ministro do Iraque Haider al-Abadi referiu-se àquela votação no Parlamento.
A “angústia” deve permanecer. Tudo, aí, tem a ver com esferas de influência imperial. Um resultado “sim” no Parlamento do Iraque significa a Força Aérea Russa trabalhando com dados de inteligência recolhida em solo por milícias xiitas como Badr Corps e Asa’ib Ahl al-Haqq, para destruir posições do falso “califato”. Geopoliticamente, um resultado “sim” no Parlamento iraquiano significa humilhação máxima – depois de todos aqueles elaborados planos de multrilhões de dólares para o “Oriente Médio Expandido” que a Operação Choque e Pavor em 2003 deveria ter posto em movimento.
A prescrição da USS Think-Tank-e-lândia para remediar toda a confusão na Síria é promover a OTAN, tipo “enviem toda a ajuda necessária” para “proteger” a Turquia, coitada.
O sultão Erdogan parece estar a um passo de lucrar com um plano de 3 bilhões de euros concebido pela chanceler Merkel para “encorajar” a Turquia a manter em seu território potenciais migrantes sírios condenados a invadir pacificamente a União Europeia. Assim o sultão terá pavimentado o caminho para, afinal, ser “aceito” no longo prazo, como membro da UE.
Problema é que o sultão Erdogan não só apoia o ISIS/ISIL/Daesh como ferramenta para mudança de regime, mas também já reiniciou sua guerra contra os curdos do [partido] PKK, aliados dos curdos do YPG, os quais, objetivamente, são aliados de Washington.
Nem essa configuração consegue impedir que o USS Think-Tank-e-lândia aconselhe que a OTAN implante uma zona aérea de exclusão ao longo da fronteira turco-síria, a ser apoiada por soldados de EUA, Turquia, Grã-Bretanha e França.
Governo dos EUA em Washington, alô-alô, estamos com um problema mesmo. Essa zona aérea de exclusão já existe. Quem manda ali é a Rússia. E vocês não conseguirão penetrar naquelas redes eletrônicas.
Rápida recapitulação, para encerrar: o Império do Caos destrói o Iraque; cria as condições para a emergência de uma constelação de salafistas jihadistas, da al-Qaeda no Iraque a essa criatura frankenstênica, o ISIS/ISIL/Daesh; não põe a mão no petróleo (lembram-se do “Somos a nova OPEP?” de Wolfowitz); tenta durante quatro anos destruir a Síria, e fracassa; e, no fim, a Rússia reinstala sua própria esfera de influência no Oriente Médio, como a verdadeira potência que combate contra o salafi-jihadismo em todo o “Siriaque”.
Se isso é o que se faz passar por planejamento imperial, com certeza o Império do Caos não precisa de inimigos.
Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna no Asia Times Online; é também analista de política de blogs e sites como: Sputinik, Tom Dispatch, Information Clearing House, Red Voltaire e outros; é correspondente/ articulista das redes Russia Today e Al-Jazeera.
Oriente Mídia
loading...
-
Síria E O Mar De Hostilidade
12/2/2016, Pepe Escobar, Sputnik Traduzido por Vila Vudu Não poderia haver início mais adequado para o Ano Chinês do Macaco, em termos geopolíticos, que a pantomima [orig. monkey business] encenada* em Munique entre o secretário...
-
Como A Rússia Está Detonando O Jogo Turco Na Síria
Pepe Escobar, RTTradução Vila VuduMas… por que Washington levou virtualmente uma eternidade para realmente reconhecer que ISIS/ISIL/Daesh vende petróleo roubado da Síria, o qual acaba sempre chegando, no mínimo, até a Turquia?Porque...
-
Iraque Autorizará Ataques Aéreos Da Rússia Contra O Isis No Território Iraquiano
Um senior oficial disse que a Rússia terá a autorização para ataques aéreos contra comboios Daesh no interior do Iraque. (Mídia estatal russa) O governo iraquiano autorizado a Rússia para alvejar Daesh (ISIS) comboios vindos de Síria,...
-
O Confronto Otan-rússia Na Síria
7/10/2015, Pepe Escobar, RT Traduzido por Vila Vudu Um Su-30 entra uns poucos metros no espaço aéreo turco, por apenas dois minutos sobre a província Hatay, e volta ao espaço aéreo sírio logo que foi alertado por dois F-16s turcos. A OTAN, como...
-
Eua Não Temem Uma “intervenção”: Temem é O Plano De Paz Da Rússia
9/9/2015, Make bombs, not refugees, Pepe Escobar, RT (e Rússia Insider) Tradução Vila Vudu Os russos estão chegando! Os russos estão chegando! Ora essa! Os russos estão sempre chegando. Os russos nunca pararam de estar chegando, desde aqueles...
De tudo