Uma República Federativa da Ucrânia?
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Uma República Federativa da Ucrânia?


O confronto na Ucrânia revela cada vez mais as contradições fundamentais existentes entre as partes ocidental e oriental do país. Foi levantada a questão de mais uma revisão da constituição, enquanto os analistas e os políticos dizem que, para salvar a sua integridade, a Ucrânia deve passar do seu modelo de Estado unitário para uma estrutura federativa.

A ideia de uma federalização da Ucrânia não é nova. Os primeiros a defender uma federação foram precisamente os habitantes do Ocidente do país, da região histórica da Galícia, que pretendiam aí instituir a sua autonomia. Contudo, quando o país obteve a sua independência em 1991, os políticos da Ucrânia ocidental consideraram o seu objetivo como alcançado e que não havia qualquer necessidade de conceder direitos autonômicos, desta vez à parte oriental. Durante a “revolução laranja” de 2004 a questão da federação voltou a ser levantada no Leste do país por Viktor Yanukovich e pelo Partido das Regiões (PR). A ideia da federalização foi colocada na base do programa político do PR, com que este se apresentou às eleições, que ganhou em 2010.

Nesta semana, os líderes da oposição declararam que não iriam permitir a federalização da Ucrânia. Porquê? Porque a parte oriental representa atualmente o papel de “vaca leiteira” para a parte ocidental, considera o diretor do Instituo dos Países da CEI (Comunidade de Estados Independentes) Konstantin Zatulin:

“Para isso existem razões econômicas diretas, porque o Ocidente da Ucrânia vive à custa de dotações criadas pelo trabalho do Leste da Ucrânia. Por exemplo, o distrito de Volyn, no oeste do país, tem 74% do seu orçamento em dotações. Entretanto, o distrito de Dnipropetrovsk, no leste da Ucrânia, fica apenas com 18% do seu produto interno bruto, o restante é-lhe retirado e redistribuído através do orçamento geral do Estado a favor do Ocidente. É criada uma situação contraditória: as pessoas na parte leste trabalham para que a parte ocidental possa ter programas sociais dispendiosos, construir estradas e túneis e fazer beneficiações. Entretanto, na parte ocidental uma significativa parte da população não vive permanentemente na Ucrânia, trabalhando como emigrantes não a favor do seu país, mas em benefício próprio na Europa ou na Rússia.”

Não é de estranhar que os políticos da Ucrânia ocidental não aceitem discussões acerca de uma federação, apesar de ela prever a eleição direta dos governadores, que atualmente são designados por Kiev. O Ocidente não quer um federalismo orçamental, na opinião de Konstantin Zatulin, ele quer continuar a meter a mão no bolso do Estado ucraniano. E também não quer que o Leste obtenha uma autonomia política.

Hoje a oposição é ativamente apoiada pelos políticos do Ocidente geopolítico. Mas é precisamente esse modelo, com a possibilidade da existência de uma autonomia das duas partes desavindas do país, que é capaz de evitar neste momento que ele se desagregue, diz Konstantin Zatulin:

“Nas atuais condições, uma federalização da Ucrânia criaria possibilidades reais para a manutenção da Ucrânia como país. Os ânimos se extremaram, mas a federalização prevê uma separação de poderes. A parte oriental não vê outra solução para uma coexistência dentro da Ucrânia que não seja a garantia de que o esquema anterior, em que o Ocidente encomenda a música e o Leste é que paga, seja inadmissível. A federalização não é um primeiro passo para uma desagregação da Ucrânia, mas sim uma vacina contra essa desagregação.”

A ideia da federalização da Ucrânia tem potencialmente fortes recursos ideológicos, econômicos e socioculturais. Mas a sua aplicação depende da vontade política de Kiev, diz o diretor executivo do Centro de Politologia Norte-Sul Alexei Vlasov:

“O tema da federalização soa com cada vez maior frequência não só na mídia ucraniana, mas também na internacional, porque na opinião de muitos peritos essa é a alternativa real ao processo de semi-desagregação que o país vive atualmente. Independentemente do desfecho da confrontação que ocorre na praça da Independência, as diferenças ideológicas, de mentalidade e civilizacional entre o Leste e o Ocidente da Ucrânia, que num momento de crise política se manifestam com mais acuidade, ameaçam a integridade do país e podem resultar na eclosão de uma guerra civil.”

A federalização é inevitável, considera igualmente o politólogo ucraniano Mikhail Pogrebinsky:

“Existem tentativas para aplicar ilegalmente já hoje alguns princípios do federalismo econômico. Os empresários da região de Lviv já declararam que não tencionam transferir a parte dos impostos que cabem ao poder central. Em vez disso, foram criadas “radas (assembleias) populares” em substituição dos conselhos distritais legítimos. Devido à fraqueza do poder central, já amadureceu há muito a necessidade de uma reforma das bases do poder local. Numa primeira fase, há que realizar uma descentralização do poder e a transferência de uma série de competências para o poder local. Isso ainda não será uma federalização, mas já serão os primeiros passos nessa direção.”

Para levar a ideia até à sua execução será necessária uma ampla discussão pública, considera Mikhail Pogrebinsky, que na Ucrânia nunca foi realizada a sério:

“É preciso começar pela atribuição aos distritos, às cidades e às regiões de muitas das funções que hoje não podem ser cumpridas sem autorização do poder central. Para conservar o país é necessário fazer baixar uma grande parte da política cultural e social, assim como econômica, para o nível regional. Essa será a linha racional que permitirá reduzir as contradições inter-regionais. ”

As contradições se foram acumulando na Ucrânia ao longo dos mais de 20 anos de independência. A ideologia de uma formação de um Estado nacional nunca foi elaborada. Nessas condições só há uma alternativa à federalização: o aumento do confronto. A questão da federalização irá surgir inevitavelmente durante a discussão do projeto da nova Constituição na qual a oposição quer reduzir os poderes do presidente. Contudo, ela também terá de contar com aqueles que não vêm só nisso as mudanças necessárias.

Voz da Rússia



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